terça-feira, 2 de setembro de 2014

Resenha: Obras-primas do terror (dvd)


A distribuidora Versátil tem feito uma excelente trabalho de resgate de filmes clássicos.O espectador tem a oportunidade de assistir produções que estavam fora do catálogo há muito tempo, ou não foram lançadas em dvd no Brasil. Dentre os digstacks da Versátil (conjunto composto por três dvds), gostaria de comentar um deles, que é específico sobre o gênero do terror, ou horror. Eu prefiro dizer terror, uma vez que os filmes selecionados nesta coleção não provocam somente o medo e estão envolvidos em uma atmosfera de mistério, suspense ou, até mesmo podem suscitar uma sensação de estranhamento no espectador quando terminam. A seguir um pequeno comentário sobre os filmes que integram essa coleção da Versátil. Posteriormente, pretendo comentá-los separadamente. 
O primeiro é O Chicote e o Corpo, do diretor italiano Mário Bava, um verdadeiro poema visual. Ao assisti-lo, o espectador vai saber porque Bava ficou conhecido como "o maestro dos filmes de terror". Existem frames que são literalmente pinturas em movimento, nas quais se destacam as cores azul vermelho, de modo que sua concepção estética sofisticada, o tornam um dos mais belos filmes de terror já produzidos. A história faz lembrar muito O Morro dos Ventos Uivantes em sua abordagem do tema de um amor maldito que une os amantes, além de desafiar às convenções sociais e a fronteira entre a vida e a morte. O protagonista do filme, Kurt (Christopher Lee, o eterno Drácula) tem muito da personalidade sombria do herói da obra de Bronte, Heathcliff, assim com Nevenka (a bela atriz Daliah Davi) exprime um desejo insano de união com Kurt, assemelhando-se assim em sua psique perturbada a Catherine. Não é exagero afirmar que O Chicote e o Corpo capta com perfeição os principais elementos do livro de Brontë até mesmo em sua ousada abordagem do elemento sobrenatural, que o insere na esfera do fantástico. Sem dúvida trata-se de um autentico filme de terror gótico, no qual o medo é gerado mais a partir do que é sugerido e sua ambientação é feita em cenários misteriosos (o interior do castelo, no qual um dos quartos abriga uma passagem secreta) e até mesmo sinistros (a câmara mortuária, na qual ocorre seu surpreende desfecho).  

             Nevenka assombrada por Kurt: alucinação ou realidade?



                 Kurt volta dos mortos para assombrar os vivos


No mesmo disco pode ser encontrado outro clássico neste gênero: A Orgia da Morte. Dirigido por Roger Corman, o filme é considerado a melhor adaptação de A morte da morte rubra, de Edgar Allan Poe. Além da impagável atuação de Vicent Price, com seus exageros e maneirismos como o cruel príncipe Próspero, o filme de Corman chama a atenção por sua fotografia em tons monocromáticos. Vale também destacar em Orgia da Morte a cena filmada como se fosse produzida por efeitos de LCD e sua sequencia final com o macabro baile de máscaras, cujo final inesperado e assustador faz com esta produção encontre uma inusitada ressonância com O Sétimo Selo, de Igmar Bergman. 


                    Vicent Price: impagável como o vilão Próspero


                            O visual psicodélico do filme de Corman
 

No segundo disco temos dois filmes realizados na década de quarenta. O túmulo vazio produzido pela RKO é adaptado de Os ladrões de corpos, conhecido conto escrito por Robert Louis Stevenson, o mesmo autor de O médico e o monstro e protagonizado por Boris Karloff. Karlof sem a maquiagem carregada de monstro de Frankenstein tem neste filme seu melhor desempenho e está assustador como o ladrão de tumbas que faz chantagem com um professor de medicina. O longa bem dirigido por Robert Wise ainda conta com a participação e outro ícone do cinema de terror: Bela Lugosi, o mais famoso Drácula do cinema, infelizmente, já demonstrando sinais de sua decadência física. Apesar de uma subtrama melodramática, o filme com um belo trabalho de fotografia em tom expressionista tem um desfecho surpreendente e instigante, o qual contribui para torná-lo um clássico do gênero terror.
                    Boris Karloff como o sinistro vilão

Outro filme que integra o mesmo disco é Na solidão da noite, até então inédito em dvd. Esta produção é a primeira no formato "história dentro de outra história". Sua narrativa é construída de forma engenhosa: um arquiteto é chamado para fazer uma reforma em uma casa e ao chegar lá encontra pessoas que ele viu um sonho que o perturba. Cada uma delas conta um acontecimento estranho que parece ter suas origens no sobrenatural. Dentre os seguimentos do filme se sobressaem o do sinistro espelho capaz de provocar o comportamento violento de homem, que gradativamente passa a demonstrar traços de insanidade e começa a ameaçar sua mulher e outro que retrata a estranha relação de um ventrílogo (Michael Redgrave, em excepcional desempenho|) com seu sinistro boneco de marionete, dirigido com maestria pelo brasileiro Alberto Cavalcanti. O filme também impressiona em trecho final, que é narrado em uma atmosfera onírica e termina de modo a instigar a imaginação do espectador.


                                   os convidados reunidos


        O ventrílogo e seu boneco: duas facetas de uma única personalidade? 
                       
Os dois últimos filmes que compõem a caixa da Versátil também representam o melhor do terror no final dos anos cinquenta e início dos anos sessenta. A noite do demônio é o filme que inspirou vários cineastas, principalmente, Sam Raimi que lhe prestou um homenagem em seu longa Arraste-me para o Inferno. O longa dirigido por Jacques Tourneur começa com a aparição de uma criatura demoníaca em uma cena que em tempos atuais é mais engraçada do que assustadora. Descontando o aspecto tosco da criatura, o qual indiretamente contribui para torna o filme mais divertido, sua trama é muito bem elaborada e gira em torno uma série de mortes provocadas por uma seita diabólica, um tema até então inesperado no cinema do terror. Destaca-se o excelente trabalho de direção de Tourneur - o mesmo diretor de Sangue de Pantera, outro clássico do terror, que impressiona pelos sofisticados movimentos de câmera que criam uma constante e eficiente atmosfera de suspense e tensão. Além disso, o desfecho de A noite do demônio é  irônico e eficiente e seu visual que evoca os filmes noir dos anos quarenta, também contribuem para assegurar sua fama de clássico no gênero.
          A aparição do "tinhoso" no filme

Esta seleção de filmes da Versátil se encerra com A aldeia dos amaldiçoados. Seu enredo começa a partir de um estranho e inexplicável evento, no qual todos habitantes de uma aldeia inglesa misteriosamente adormecem. Logo depois, algumas mulheres que habitam o lugar ficam misteriosamente grávidas e quando as crianças nascem é constatado que elas diferem das demais por sua aparência (todas elas louras e com olhos azuis) e, principalmente, por seu intelecto avançado. Inicialmente, essas crianças são vistas com um prodígio da Natureza por um cientista (George Sanders, em ótima atuação), mas aos poucos, elas revelam ser malignas e perigosas, uma vez que demonstram possuírem poderes extraordinários tais como o de hipnose e de controlar a mente dos habitantes da aldeia. Neste filme também se sobressaem a competente direção do alemão Wolf Willa e a marcante presença do líder das crianças sinistras, que é interpretado pelo ator mirim que faz Miles em Os Inocentes, filme adaptado de A volta do parafuso, de Henry James. Assim como outros títulos inseridos no digstack da Versátil este filme também tem um final muito interessante e que contribui para torná-lo um cult dentro do gênero terror/ ficção científica, além de possibilitar que seja visto como uma metáfora sobre a ameaça da infiltração da ideologia comunista no Ocidente e na Inglaterra. 


                      as crianças sinistras em ação

A aldeia dos amaldiçoados foi refilmado nos anos noventa por um especialista no gênero, John Carperter. No entanto, o filme original é bem melhor que o remake devido ao seu aspecto metafórico e sua inovadora mistura à época de terror e elementos de  ficção científica.
Como extras, além dos traillers, sua principal atração é uma entrevista do diretor Roger Corman, em que o diretor norte-americano relata os bastidores e o processo de produção de A Orgia da Morte.
cotação do digpack (filmes e extras): ***** (excelente)
  

Nenhum comentário:

Postar um comentário