quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Resenha: A assombração da casa da colina, de Shirley Jackson

Finalmente, consegui ler este romance muito elogiado por Stephen King em Dança Macabra, seu livro de ensaios sobre o gênero do terror no cinema e na literatura. Apesar ter visto o filme (The Haunting, a resenha foi publicada no meu blog) baseado neste livro da autora norte-americana Shirley Jackson, me surpreendi positivamente com ele.

                                                  Shirley Jackson 

Jackson tem uma escrita sofisticada, na qual se sobressai o uso de metáforas para descrever tanto o assustador cenário de seu romance – a sinistra Casa da Colina, que em seu enredo aparece como se fosse uma personagem, quanto para delinear a complexa e estranha personalidade de sua protagonista, Eleonor Vance, uma de suas notáveis criações da autora e, talvez uma das melhores da literatura norte-americana de terror gótico do século XX.
Vale ressaltar que não é tanto a exploração do “batido” tema da casa mal assombrada que se destaca neste romance, mas forma como Jackson desenvolve sua narrativa que possibilita muitas leituras, até mesmo pelo viés do fantástico, de acordo com Todorov. Neste aspecto, me parece que, apesar de ser um livro de leitura fácil, este ao ser traduzido deve perder um pouco de seu aspecto intrigante.
Sua premissa é bastante simples. O pesquisador Montague Sommers reúne um grupo de pessoas, algumas delas supostamente com habilidades especiais, com o propósito de investigar a existência de estranhos eventos em uma antiga mansão conhecida como "Casa da Colina". Ela fica localizada em região isolada e, desde o começo do romance é descrita como um organismo vivo, de natureza maligna e duradoura. Além disso, a Casa da Colina também serviu de cenário para mortes misteriosas, que desafiam a imaginação dos habitantes que moram em suas proximidades. 

                                        A sinistra Casa da Colina

Nesta investigação acerca dos mistérios envolvendo esse lugar assustador, Sommers conta com a ajuda de Eleonor, uma mulher sofrida e, que aos poucos demonstra sinais de perturbação mental. Ela estabelece uma relação de amizade – em que é sugerida de forma sutil uma atração sexual, com Teodora, uma mulher excêntrica, que também parece ser sensitiva e com Luck, um rapaz fanfarrão e irreverente que participa do grupo, porque tem interesse em herdar a antiga propriedade. Contudo, gradativamente, Eleonor vai se sentindo cada vez mais ligada a Casa da Colina e tem a sensação de que está se tornando uma extensão dela. Durante o desenvolvimento do romance, chama a atenção na escrita de Jackson os personagens bem elaborados, que fogem do esquema maniqueísta, a utilização inventiva de artifícios recorrentes dos romances góticos, visando instaurar no interior da Casa da Colina uma contínua atmosfera sobrenatural, sem apelar para aparição de entidades fantasmagóricas.

                                     a equipe de caça-fantasmas

Jackson se vale da descrição detalhada do cenário, de modo que leitor consiga visualizá-lo nos mínimos detalhes, ou seja, como algo vivo que parecer ter vida própria e, por isso capaz de provocar uma constante sensação de estranhamento. Embora a autora sugira a existência de uma manifestação do elemento sobrenatural no interior da casa, por meio de acontecimentos aparentemente inexplicáveis, tais como um intenso frio um dos corredores ou a intensa batida que deforma a aparência da porta do quarto de Leonor, ela mantém sobre ele uma aura de obscuridade que se mantém intacta até o desfecho abrupto e surpreendente de seu romance.

     Eleonor: louca ou vítima das ações de terrível força força sobrenatural?

Talvez, para aqueles que procuram em A assombração da casa da colina cenas de horror no estilo de outras, que aparecem e se destacam em livros de Stephen King e demais autores possam ficar decepcionados com o romance de Jackson que explora a temática sobrenatural de forma discreta, sem nenhuma cena de sangue ou violência. Por outro lado, os leitores que visam encontrar uma forma de provocar o medo e tensão, principalmente, associado aos terrores que podem ter sua origens no lado obscuro e até certa medida, sinistro da mente humana vão encontrar muita coisa para apreciar neste livro que quando termina deixa muitas dúvidas no ar e por é capaz de permanecer em nossa memória durante muito tempo.  Para mim, assim como na opinião King, trata-se de um grande clássico do gótico moderno, assustador e fascinante ao mesmo tempo, que demonstra o talento de uma autora pouco conhecida no Brasil e que merece ser descoberta pelos leitores.
Cotação: ***** (excelente)
Observação: Infelizmente, este romance em português foi publicado pela editora Francisco Alves pelo selo “mestres do horror e da fantasia” nos anos oitenta e encontra-se esgotado. Se quiser é possível encontra-lo em sebos, mas eu aviso que os preços são exorbitantes. Eu li em inglês (quem tem domínio da língua, eu sugiro que leia os textos de Jackson no original, uma vez que se traduzidos eles parecem “perder” em muitos aspectos) uma edição da American Library, que contém este e outro chamado Nós sempre vivemos em um castelo (em breve será resenhado no blog), assim como 21 contos escritos pela autora.  

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