Quadrinhos é literatura?
Em seu livro "O demônio da teoria", Antoine Compagnon define a literatura da seguinte forma:
"Após o estreitamento que sofreu no século XIX, a literatura reconquistou desse modo, no século XX, uma parte dos territórios perdidos: ao lado do romance, do drama e da poesia lírica, o poema em prosa ganhou seu título de nobreza, a autobiografia e o relato de viagem foram reabilitados, e assim por diante. Sob a etiqueta de paraliteratura, os livros para as crianças, o romance policial, a história em quadrinhos foram assimilados. Às vésperas do século XXI, a literatura é novamente quase tão liberal quanto as belas-letras antes da profissionalização da sociedade."
Essa afirmação de Campagnon reflete sua perspectiva sobre o que é literatura, embora o faça de um modo um pouco confuso: O autor se refere a alguns gêneros literários por meio do termo paraliteratura, o que sugere a idéia de que eles estão a margem do que pode ser considerado literatura dentro dos padrões aceitáveis pela crítica literária. Por outro lado, Compagnon salienta que a literatura na época em que vivemos é quase tão liberal, ou seja, flexível, como era no século XVIII, uma época marcada pelo surgimento do romance, que nas suas origens era visto como um gênero menor, muito inferior à poesia. É a partir daí que podemos afirmar que também o conceito de literatura é muito variável e se modifica, assumindo novo significado em diferentes épocas.
É provável que Campagnon assim como outros estudiosos de literatura estejam se debatendo em torno de uma questão que deve analisada: afinal em pleno século XXI o quê é literatura?
Essa questão e tantas outras que aparecem no meio acadêmico tornou-se tema de um caloroso debate entre os estudiosos.Mais uma vez chega-se a uma aporia, expressão amplamente usada por Compagnon, que enfatiza pontos de vista contraditórios: de um lado estão aqueles que defendem o conceito de literatura avalizado no século XIX, onde aceita-se somente como formas literárias tradicionais (drama, poesia, teatro e suas intersecções no romance e no conto). Do outro, um grupo defende a ideia de que na época atual existe um tipo de narrativa que também pode ser considerado literatura: a história em quadrinhos.
É aí que a coisa se complica ainda mais. Por que nem todas as hqs, como são popularmente conhecidas, podem ser consideradas literatura. A HQ, em sua essência é um modo de entretenimento: afinal personagens como Tio Patinhas, Mônica, Super-Homem, Batman, fazem parte de nossa infância. Assim, a HQ parece estar associada ao universo infantil e somente ter alguma importância dentro dele.
No entanto, do mesma maneira que outros tipos de narrativa, a HQ também passou por um processo de evolução, que tudo indica terá novos desdobramentos.Após um longo período em que os enredos das HQs eram pueris, assemelhando-se a filmes de aventura e procurando identificar-se com o mundo infantil, alguns artistas gráficos começaram a experimentar e explorar novas técnicas de narração e ilustração e recursos narrativos nas HQs. Os europeus Moebieus, Enki Bilal, Milo Manara, somente para citar alguns nomes que contribuíram para a renová-las, fornecendo à elas uma roupagem nova elevando-as à condição de grafic novel (romance gráfico). Assim, as HQs ganharam um novo e sofisticado formato, destacando-se pelo apelo visual,e, principalmente, por suas tramas complexas que dialogavam com a arte cinematográfica e diferentes tipos de literatura, tais como a ficção cientifica e romance policial ou de mistério e, até mesmo reiventando antigos mitos.
Mas foi somente em 1992, que a aceitação da HQ como literatura ampliou-se ainda mais.Isso por que neste ano, Maus, a grafic novel Maus que trata de modo metafórico do tema do Holocausto e escrita pelo norte-americano Art Spiegelman, ganhou o Pulitzer, considerado o prêmio literário mais importante dos Estados Unidos.Além do reconhecimento do trabalho de Spigelmen, "Sonho de uma noite de verão", uma HQ que integra a série Sandman, do escritor inglês Neil Gaiman (devido a importância dessa obra inovadora, vou comentá-la em outro post com mais detalhes) ganhou em 1991 o Word Fantasy Award, outro importante prêmio literário, na categoria conto, ampliando a discussão sobre o que é literatura na época atual.
No entanto, apesar do reconhecimento da "qualidade literária", digamos assim, de algumas HQS, principalmente, grafic novels, que destacam-se principalmente, pelos recursos narrativos empregados (mudança de focalização, avanços e recuos no tempo, diálogos intertextuais com obras literárias, dentre outros) alguns estudiosos insistem em manter a dicotomia entre a literatura e os quadrinhos.
Esse argumento é defendido por que apesar de ser um tipo de narrativa os quadrinhos são constituídos basicamente por imagens, nas quais o texto somente aparece e assume importância em balões e espaços, limitando assim a dimensão da narrativa. No entanto, isso parece não ser mais um empecílio para alguns artistas que, por meio da representação imagética, procuram "contornar" essas limitações da narração, por meio de elementos visuais, que descrevem eventos que a integram ou demonstram ações e sentimentos dos personagens. O resultado é que algumas grafic novels, dentre elas as premiadas Asterios Poliphy e a brasileira Day Tripper, dos Irmãos Bá parecem ter rompido a barreira que separa a HQ da literatura, de modo que essas duas formas de narrativa possam ser aceitas como uma coisa só.
Como se vê, a questão é polêmica e, provavelmente ainda dará origens a muitos debates.Mas uma coisa é certa: conforme disse Compagnon o conceito de literatura é volátil e muda de acordo a época. Em plena era em que a linguagem visual tem grande poder de comunicação, principalmente, entre os jovens e adolescentes, não podemos desconsiderar a possibilidade de que ela pode e deve ser usada como um recurso para conduzir a narrativa. Então, por que não é possível a aceitação das grafic novels como literatura? O que impede que isso aconteça, se até mesmo alguns críticos literários reconheceram o valor de alguns títulos recentemente publicados comparando-os a outros textos escritos por autores reconhecidos. Talvez, seja o momento dos estudiosos de literatura do Brasil darem mais atenção a este assunto e buscaram novas acepções para o termo literatura, antes que ele desapareça no tempo.
Essa questão e tantas outras que aparecem no meio acadêmico tornou-se tema de um caloroso debate entre os estudiosos.Mais uma vez chega-se a uma aporia, expressão amplamente usada por Compagnon, que enfatiza pontos de vista contraditórios: de um lado estão aqueles que defendem o conceito de literatura avalizado no século XIX, onde aceita-se somente como formas literárias tradicionais (drama, poesia, teatro e suas intersecções no romance e no conto). Do outro, um grupo defende a ideia de que na época atual existe um tipo de narrativa que também pode ser considerado literatura: a história em quadrinhos.
É aí que a coisa se complica ainda mais. Por que nem todas as hqs, como são popularmente conhecidas, podem ser consideradas literatura. A HQ, em sua essência é um modo de entretenimento: afinal personagens como Tio Patinhas, Mônica, Super-Homem, Batman, fazem parte de nossa infância. Assim, a HQ parece estar associada ao universo infantil e somente ter alguma importância dentro dele.
No entanto, do mesma maneira que outros tipos de narrativa, a HQ também passou por um processo de evolução, que tudo indica terá novos desdobramentos.Após um longo período em que os enredos das HQs eram pueris, assemelhando-se a filmes de aventura e procurando identificar-se com o mundo infantil, alguns artistas gráficos começaram a experimentar e explorar novas técnicas de narração e ilustração e recursos narrativos nas HQs. Os europeus Moebieus, Enki Bilal, Milo Manara, somente para citar alguns nomes que contribuíram para a renová-las, fornecendo à elas uma roupagem nova elevando-as à condição de grafic novel (romance gráfico). Assim, as HQs ganharam um novo e sofisticado formato, destacando-se pelo apelo visual,e, principalmente, por suas tramas complexas que dialogavam com a arte cinematográfica e diferentes tipos de literatura, tais como a ficção cientifica e romance policial ou de mistério e, até mesmo reiventando antigos mitos.
Mas foi somente em 1992, que a aceitação da HQ como literatura ampliou-se ainda mais.Isso por que neste ano, Maus, a grafic novel Maus que trata de modo metafórico do tema do Holocausto e escrita pelo norte-americano Art Spiegelman, ganhou o Pulitzer, considerado o prêmio literário mais importante dos Estados Unidos.Além do reconhecimento do trabalho de Spigelmen, "Sonho de uma noite de verão", uma HQ que integra a série Sandman, do escritor inglês Neil Gaiman (devido a importância dessa obra inovadora, vou comentá-la em outro post com mais detalhes) ganhou em 1991 o Word Fantasy Award, outro importante prêmio literário, na categoria conto, ampliando a discussão sobre o que é literatura na época atual.
No entanto, apesar do reconhecimento da "qualidade literária", digamos assim, de algumas HQS, principalmente, grafic novels, que destacam-se principalmente, pelos recursos narrativos empregados (mudança de focalização, avanços e recuos no tempo, diálogos intertextuais com obras literárias, dentre outros) alguns estudiosos insistem em manter a dicotomia entre a literatura e os quadrinhos.
Esse argumento é defendido por que apesar de ser um tipo de narrativa os quadrinhos são constituídos basicamente por imagens, nas quais o texto somente aparece e assume importância em balões e espaços, limitando assim a dimensão da narrativa. No entanto, isso parece não ser mais um empecílio para alguns artistas que, por meio da representação imagética, procuram "contornar" essas limitações da narração, por meio de elementos visuais, que descrevem eventos que a integram ou demonstram ações e sentimentos dos personagens. O resultado é que algumas grafic novels, dentre elas as premiadas Asterios Poliphy e a brasileira Day Tripper, dos Irmãos Bá parecem ter rompido a barreira que separa a HQ da literatura, de modo que essas duas formas de narrativa possam ser aceitas como uma coisa só.
Como se vê, a questão é polêmica e, provavelmente ainda dará origens a muitos debates.Mas uma coisa é certa: conforme disse Compagnon o conceito de literatura é volátil e muda de acordo a época. Em plena era em que a linguagem visual tem grande poder de comunicação, principalmente, entre os jovens e adolescentes, não podemos desconsiderar a possibilidade de que ela pode e deve ser usada como um recurso para conduzir a narrativa. Então, por que não é possível a aceitação das grafic novels como literatura? O que impede que isso aconteça, se até mesmo alguns críticos literários reconheceram o valor de alguns títulos recentemente publicados comparando-os a outros textos escritos por autores reconhecidos. Talvez, seja o momento dos estudiosos de literatura do Brasil darem mais atenção a este assunto e buscaram novas acepções para o termo literatura, antes que ele desapareça no tempo.
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